“Rico sou... e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu” (Ap3.17 ACF)
(*) Wilson Franklim
Meu alvo neste artigo é demonstrar os meios pelos quais o entretenimento se introduziu nas igrejas evangélicas nos últimos 120 anos, sua forte presença hoje. E suas terríveis consequências para a pregação do verdadeiro Evangelho.
No final do século 19 o grande pregador Spurgeon deu o alerta, ele já prenunciava o declínio que estava por vir nas igrejas em relação à adoração: “O fato é que muitos gostariam de unir igreja e palco, baralho e oração, danças e ordenanças. Se nos encontramos incapazes de frear essa enxurrada, podemos, ao menos, prevenir os homens quanto a existência e suplicar que fujam delas”.1 Nessa perspectiva, Tozer 60 anos depois em 1950 confirmava: “o entretenimento religioso já está em muitos lugares, rapidamente desalojando as coisas sérias de Deus”.2 Em 1970, Lloyd-Jones já mostrava a pregação, do Evangelho, em crise: a “tendência, hoje (1970), é de depreciar a pregação em prol de várias outras formas de atividade.”3
Todavia, observem a leitura de Timmerman, quase 25 anos depois das palavras de Lloyd-Jones (1990-95): “em muitas igrejas o sermão é uma ilha que diminui cada vez mais em um mar turbulento de atividades.”4 A pregação não é mais vista como sendo a voz de Deus falando ao seu povo.
Mas o que causou todo esse estrago nas igrejas?
I. O Surgimento do Show Business
Charles Spurgeon batalhou muito na Controvérsia do Declínio no final do século 19, mesma época em que a era da exposição começou a terminar. Paralelamente uma tendência mundial começava a nascer, o surgimento do entretenimento como centro da vida cultural e familiar. Essa nova filosofia de vida começou a se fortalecer cada vez mais, tomou corpo e norteou todo século 20. Prossegue no século 21 com vigor na vida secular e também na religiosa.
Desta forma, nasceu a era do Show Business a 110 anos atrás. Filmes, dramatizações, programas de auditório, inicialmente rádio e depois tele-novelas com advento da televisão, colocaram o show business no centro de nossas vidas e também de muitas igrejas.
No show business a verdade é irrelevante. O que realmente importa é se a pessoa está ou não sendo entretida, “feliz”... O estilo é tudo; portanto, atribui-se pouco valor ao conteúdo. Desse modo, se determinado programa está com super audiência, isso é o que vale.
No show business a forma como o veículo é passado ao povo se torna a mensagem. Portanto, pode-se dizer que o veículo é a mensagem.5 É essa maneira de pensar que rege o mundo atual. E também a grande maioria das igrejas seguidoras dos métodos a base de entretenimento.
II. Inicialmente a Igreja Resistiu a Sedução do “deu$” Entretenimento
Na realidade, durante séculos as igrejas se mantiveram firmes contra toda forma de entretenimento mundano dentro de seus cultos. Porque o reconhecia como um dispositivo de perda de tempo, um refúgio contra a perturbadora voz da consciência. E por manterem posições, de santas esposas de Cristo, as igrejas sofreram muitos ataques por parte do mundo.
Porém, nos últimos 60 anos, muitas igrejas se cansaram dessa luta. Optaram por ser politicamente corretas e passaram a oferecer uma alternativa de igreja que não confronte o pecado; que amenize o escândalo da cruz. Mas, principalmente, que ofereça uma mensagem de prosperidade financeira, e que fale o que o povo quer ouvir. Em fim, uma igreja mais “amigável” e atraente para com o mundo.
A idéia é que se a igreja não pode vencer o “deus entretenimento”, o melhor é unir forças com ele, e aproveitar ao máximo seus “poderes”. Razão pela qual se observa hoje, milhões sendo gastos em templos mais aconchegantes, com palcos especiais, sons de ultima geração, bancadas acolchoadas... E treinamento especializado do pessoal de liderança, mas, não o treinamento bíblico. O foco, agora, é investir na elite eclesial com muitos cursos de marketing, técnicas de crescimento rápido (numérico) de igreja e administração financeira. Por outro lado, o investimento nas pessoas, os membros, caiu drasticamente, pois estes não necessitam estudar a Bíblia, pois seus líderes já lhes fornecem tudo pronto. E assim, tonam-se uma clientela “vip”, ávida por consumir as tão propaladas “bençãos”. Que não são nada barato...
Face a alta rentabilidade das igrejas modernas, as maiores passaram a investir em empresas de comunicações, que alavancam cada vez mais seus business. Tamanha é a rentabilidade, que algumas mega-igrejas já possuem: bancos, mansões, jatinhos executivos, carros de super blindagem para os “semi-deuses” que as imperam...
Nessa perspectiva, o sucesso financeiro de alguns “semi-deuses”, através de suas mega-tele-igrejas, tem arrastado muitas igrejas de pequeno e médio porte a se tornarem pobres teatros de quinta categoria. Nas quais os respectivos produtores, mascateiam suas mercadorias com plena aprovação dos seus pastores. Pastores, estes, que sonham um dia se tornar um “semi-deu$”. E ainda citam textos bíblicos para justificar tamanha delinqüência.
Alguns pastores justificam que devemos estar a abertos às novas maneiras de evangelizar hoje. Que devemos abandonar o passado que nos enrijece (?). Porque se o método deu certo na mega-igreja tal é porque é bom. Será que toda essa opulência, e seus meios para aquisição de recursos tem a aprovação de Deus? A resposta é não.
Agora veja: Essa triste realidade que hoje sufoca o verdadeiro cristianismo é aquilo que a igreja flertava na época de Spurgeon (1890); que se tornou fascinação nos dias de Tozer (1950). E nos últimos 10 anos se converteu em obsessão doentia para grande parte do segmento evangélico, inclusive em muitas igrejas batistas.
O lamentável é que as mais variadas formas de entretenimento encontradas na igreja de hoje, em sua maioria, são completamente seculares. E pagãs em seu lado místico, desse modo, sem nenhum aspecto cristão.6
Ainda assim, a maioria dos pastores, atualmente, se renderam a adoção do entretenimento como parte litúrgica de seus cultos. O resultado foi
III. O Casamento da Igreja com o “deus” Entretenimento
O púlpito, em muitas igrejas, transformou-se em mero palco e a igreja, simples platéia. Pastores animam seus auditórios com frases de efeito, contentam suas igrejas com mensagens superficiais...”7
Para os padrões atuais, essas questões que tanto afligiram Spurgeon, e tantos outros, parecem insignificantes hoje. De certa forma, dá a impressão que todos nós já absorvemos tais práticas (de entretenimento no culto) como sendo normais. Por ex.: Encontros espirituais de jovens são realizados tendo como atração principal “shows de danças” inseridos nos “cultos”...
Outro equívoco que se tornou “normal” são as cantorias repetitivas, mas com muita emoção e sem entendimento. Orações inflamadas, regadas a muito “choro” onde todos falam ao mesmo tempo; brados de aleluias e até assovio são partes integrantes do culto moderno.
Se não bastasse tamanha distorção dos princípios litúrgicos do Novo Testamento. Após longo tempo de preparação (psicológica é claro) vem alguém (o líder “miraculoso”) trazer uma palavra de fé. A mensagem é muito mais de auto-ajuda que ajuda do auto. Ou então, um “ex-isso”, “ex-aquilo”; vem contar uma história mirabolante de impressionar a maioria (que pouco pensa). E, ao final, todos saem dizendo: nosso encontrão “bombou”, foi demais...
Em outras palavras, foi demais porque todos se divertiram e se sentiram bem. E há uma razão para isso: A maioria dos cânticos, orações e mensagens, são meios de auto-reconciliação, de auto-ajuda e auto-aceitação. O resultado final é a sensação de se ir para casa "aliviado" e se sentindo bem, contudo, infelizmente, sem ter verdadeiramente adorado o Santíssimo Deus.
O que condenamos não é entretenimento em si mesmo.8 Mas a equivocada utilização dessa prática como elemento de culto, e principalmente a maligna filosofia que está por trás de seu uso, a mudança no foco bíblico da igreja. Os evangélicos estão usando o entretenimento, nos cultos públicos, como ferramenta de crescimento de igreja sem nenhum filtro bíblico. Nem mesmo a razão, o bom senso está funcionando como filtro. Tal fato é uma subversão das prioridades da igreja descritas no Novo Testamento.
O modelo para o “pastor” dessa nova igreja, não é mais o profeta de Deus, o pastor bíblico. Ele agora é o executivo de grande empresa; o político; o animador de programas ( a semelhança dos auditórios das tvs). E assim índice de popularidade para a igreja moderna, se tornou muito mais importante que o nível de espiritualidade.
Contudo, o fato problemático permanece: hoje é difícil encontrar alguém que ouse levantar voz contra todo esse mundanismo dentro da igreja.9
Conclusão
Devemos estar cientes de que a introdução do entretenimento como parte cúltica corrompe a sã doutrina, descarta os instrumentos primordiais do ministério pastoral: pregação e ensino, o próprio método de Jesus.
A igreja jamais poderá mercadejar o ministério que recebeu de Jesus Cristo, como alternativa de entretenimento secular. A igreja é o corpo de Cristo (1Co12.27), suas reuniões são para adoração e instrução dos salvos (Ef. 4.12).
Nós pastores, somos embaixadores de Cristo para promover a reconciliação dos perdidos com Deus (2 Co 5.20). Não somos apresentadores e nem animadores de auditório; e nem camelôs. Nosso desafio hoje é nos purificar “de toda imundícia da carne e do espírito, aperfeiçoando a santificação no temor de Deus” (2Co7.1).
Wilson é pastor da Ig. Batista em Vila Jaguaribe,
Piabetá-RJ.Contato: wilfran@gmail.com